Fobias em Animais: Prevenção e Tratamento - Vetsapiens

BLOG – Como prevenir ou amenizar as fobias em animais aos fogos de artifício

28 de dezembro de 2023
Tutor que tenta tratar fobias em animais

As fobias em animais (medo excessivo) podem se manifestar na forma de diferentes alterações de comportamento, como tentativas de fuga (às vezes resultando em autolesões), micção e defecação inadequados, vocalização excessiva, comportamentos destrutivos, busca de contato próximo com humanos, tremores, salivação, esconder-se, andar de um lado para o outro, agressividade, brigas entre animais, entre outros.

A exposição repetida a tempestades, trovões e fogos de artificio pode levar à maior sensibilização e possível generalização e exacerbação dos sintomas.

Sabemos que muitos cães com essas fobias também apresentam problemas de ansiedade de separação (alguns pesquisadores estimam que até 90% dos cães com ansiedade de separação possuem outros distúrbios comportamentais). No entanto, fobias a ruídos altos também podem surgir independentemente de outros transtornos de ansiedade. Assim, devemos sempre avaliar sempre cada caso isoladamente.

Existem várias terapias de manejo para prevenir a exacerbação dos sintomas e em casos de fobais graves, devemos encorajar os tutores a procurarem um profissional comportamentalista para auxiliá-los nas técnicas abaixo:

Terapias comportamentais para tratar fobias em animais:

1. A dessensibilização

A dessensibilização é uma das técnicas que pode ser ensinada e deve ser realizada como complemento a outras terapias para tratar fobias em animais. A dessensibilização nada mais é que a exposição a um estímulo nocivo em uma intensidade baixa, insuficiente para produzir a resposta fóbica, com o aumento gradual de intensidade à medida que o cão exibe uma capacidade de enfrentamento.

Por exemplo, muitos cães exibem comportamento fóbico ao som de um trovão ou ao som de fogos de artificio. Nesses casos, uma gravação em CD de ruídos de trovão ou fogos, tocada inicialmente em um nível baixo e aumentada gradualmente com o tempo, pode ajudar. No entanto, muitos cães têm múltiplos estímulos desencadeadores, como vento, odores de chuva e mudanças na pressão barométrica, raios e chuva ou no caso dos fogos de artificio, a luz emitida nas explosões.

Nesses casos, a dessensibilização contra muitos estímulos, não só auditivos, não é possível. Em outros casos, o estímulo disparador não é identificável, portanto, uma estratégia de dessensibilização pode não ser efetiva. Mas o tutor pode tentar esta estratégia usando gravações caseiras ou até mesmo gravações comerciais encontradas na internet.

2. O “contra-condicionamento”

O “contra-condicionamento” clássico pode criar uma associação positiva com fogos de artifício se a ansiedade não for extrema. Podemos sugerir que os tutores deem recompensas de alimentos muito palatáveis (petiscos, ração úmida ou manteiga de amendoim) e ofereçam os brinquedos favoritos e ou brincadeiras prediletas durante eventos mais leves.

O objetivo é que o animal aprenda que fogos de artifício resultam em recompensas altamente agradáveis. Por exemplo, brincar ou alimentar o cão com guloseimas enquanto o cão está sujeito a baixos níveis de estímulos nocivos (ruído de fogos, trovão, etc.) deve conseguir uma associação positiva entre som e guloseimas.

Depois de concluído, o treinamento deve passar para uma intensidade gradualmente maior (dessensibilização). Explicar que os cães nunca devem ser punidos quando apresentarem um comportamento de medo, pois isso apenas aumentará o nível de angústia. A intensidade crescente do estímulo deve ser administrada de forma que em nenhum momento induza um comportamento de medo. O objetivo é garantir uma associação positiva com o estímulo em todos os momentos.

3. Treinamento de relaxamento

O Treinamento de relaxamento. A modificação do comportamento leva tempo, esforço e repetição. Devemos encorajar os tutores a treinarem seu animal para se acomodar e relaxar em sua própria cama ou área de conforto (porto seguro) deve ser o foco do treinamento baseado em recompensa, antes dos exercícios de dessensibilização para garantir que o animal possa primeiro ser acalmado e acomodado na ausência de estímulos potencialmente evocadores de medo e devem realizar essas atividades várias vezes ao dia.

Devem fornecer um ambiente seguro e protegido onde o animal tenha um maior senso de controle e previsibilidade. Isso pode ser feito encorajando respostas positivas antes de fornecer as coisas que o cão valoriza, bem como um comportamento gratificante que seja espontaneamente calmo e relaxado.

Devemos explicar que é melhor começar a treinar durante nas épocas do ano quando a exposição aos fogos e aos estímulos sonoros que evocam o medo possam ser evitados, de forma preventiva, para que o animal possa ser beneficiado antes da próxima temporada de tempestades ou das festas de fim de ano.

O uso de coletes e faixas compressivas no tórax podem ter benefícios antiestresse se usados de maneira adequada.

Terapias medicamentosas:

Algumas vezes o uso de medicamentos ansiolíticos pode ser necessário para ajudar nas fobias mais graves de tempestades, trovões e fogos.

O Alprazolam é um ansiolítico de ação curta, comumente empregado no tratamento de fobias de tempestade e fogos de artifício (dose :0,01 – 0,1 mg/kg PO) pode ser administrado aproximadamente 1 hora antes do surgimento dos eventos sonoros. Outros benzodiazepínicos podem ser combinados com os outros medicamentos de uso diário listados abaixo, conforme necessário, antes das tempestades, fogos e outros eventos sonoros que causam fobias. O efeito amnésico do Alprazolam pode ser útil para reduzir o impacto de um evento no comportamento futuro do cão.

Outros medicamentos que podem ser utilizados de forma preventiva:

  • Fluoxetina 1-2mg / kg PO q12-24hrs
  • Clomipramina 1-3mg / kg PO q12hrs (com alimento)
  • Amitriptilina 1-2mg / kg q12h PO para iniciar (Global 2013).
  • Diazepam 0,5 – 2,2 mg / kg PO.

Para os benzodiazepínicos, iniciar sempre com doses baixas. É recomendado fazer um teste de dosagem antes de qualquer evento para garantir que não haja efeitos paradoxais e para determinar a dose ideal para acalmar o cão. Como alternativa, outros benzodiazepínicos podem ser mais eficazes para alguns cães.

Levar em conta que os benzodiazepínicos frequentemente aumentam a fome, então o cão pode ter seu apetite aumentado e pode ter uma agressão temporária em torno de alimentos, especialmente após a dosagem. Portanto tome cuidado se houver outros animais, se houver comida deixe o animal sozinho para comer, até que o medicamento seja metabolizado.

Trazodona – doses iniciais de 2-5mg /kg, podendo ser administrada a cada 8 horas. Começar antes do evento, pelo menos 1 hora antes e repetir se necessário.  Pode ser utilizada isoladamente ou em conjunto com outros ansiolíticos e antidepressivos (fluoxetina, clomipramina) em uma programação de rotina.

Gabapentina também pode ser usada em cães que sofrem de ansiedade e estresse crônicos, podendo ajudar a acalmar seu paciente e reduzir os comportamentos associados à ansiedade, como latidos excessivos, e agressividade.

No entanto, é importante notar que a gabapentina não deve ser usada como tratamento exclusivo para a ansiedade e fobia à fogos em cães, e sim como parte de um plano de tratamento mais abrangente que inclui mudanças comportamentais, terapia e associação com outros medicamentos. A sode utilizada para cães é de  10-40mg/kg e para gatos 100-200mg/por gato, 2 horas antes dos fogos.

Todos esses fármacos mencionadas possuem variação de efeito individual, portanto o ideal é testar a dose efetiva ate chegar na dose ideal.

Existem ainda os feromônios, como o “Feromônio Apaziguador de cães (DAP)” que está disponível em diferentes apresentações – spray, difusor ou em coleiras e tem demonstrado ajudar com ansiedade de separação e fobias a ruídos. Não tem efeitos colaterais conhecidos e pode ser usado com segurança sozinho ou em conjunto com outros medicamentos ( https://www.ceva.com.br/Produtos/Lista-de-Produtos/Adaptil-Difusor-e-Refil ) e para gatos o hormônio sintético Felliway ( https://www.feliway.com/br)

Em outros países existe ainda o SILEOR (gel oromucoso de dexmedetomidina) que é um sedativo agonista, alfa-2 adrenérgico, indicado para o tratamento da fobia a ruídos em cães, na dose de dose de 125 mcg/m2. O efeito terapêutico ocorre dentro de 30 a 60 minutos e a primeira dose pode ser administrada logo que o cão mostrar sinais de ansiedade e/ou medo, ou cerca de 60 minutos antes do estímulo sonoro aversivo ocorrer. E cada dose dura entre 2 à 3 horas e pode ser administrada a cada duas horas, até cinco vezes no dia. (https://www.zoetispetcare.com/products/sileo )

ATENÇÃO – a Acepromazina induz sedação, mas não é indicada sua prescrição, pois não é eficaz para reduzir a ansiedade e o medo portanto, portanto não deve ser usada nesses eventos!

O uso de melatonina e outras terapias naturais, fitoterápicas e homeopáticas têm sido usadas anedoticamente para tratar transtornos de ansiedade. A maioria pode ser usada simultaneamente com antidepressivos e ansiolíticos, exceto se o seu modo de ação for para aumentar ainda mais a transmissão da serotonina (por exemplo, o triptofano e a erva de São João devem ser evitadas).

Literatura complementar:

  1. Blackwell EJ, Bradshaw JWS, Casey RA. Fear responses to noises in domestic dogs: Prevalence, risk factors and co-occurrence with other fear related behaviour. Appl Anim Behav Sci 2013; 145, 15-25
  2. Crowell-Davis SL, Seibert LM, Sung W, Parthasarathy V, Curtis TM. Use of Clomipramine, Alprazolam, and Behavior Modification for Treatment of Storm Phobia in Dogs. J Am Vet Med Assoc 222[6]:744-748 2003
  3. Gruen ME, Sherman BL. Use of trazodone as an adjunctive agent in the treatment of canine anxiety disorders: 56 cases(1995-2007). J Am Vet Med Assoc, 2008;233(12):1902-7.
  4. Gruen ME, Sharman BL. Animal behavior case of the month: thunderstorm phobia. J Am Vet Med Assoc. 2012;241(10):1293-5.
  5. Ibáñez M, Anzola B. Use of fluoxetine, diazepam, and behavior modification as therapy for treatment of anxiety-related disorders in dogs. Vet Behav, 2009;4[6]:223-229
  6. Korpivaara M, Laapas K,  Huhtinen M, Schöning B, Overall K.Dexmedetomidine oromucosal gel for noise-associated acute anxiety and fear in dogs-a randomised, double-blind, placebo-controlled clinical study. Vet Rec. April 2017;180(14):356
  7. Levine ED, Mills DS. Long term follow-up of the efficacy of a behavioural treatment programme for dogs with firework fears. Vet Rec 2008; 162, 657–9
  8. Levine ED, Ramos D, Mills DS. A prospective study of two self help CD based desensitization and counter-conditioning programmes with the use of Dog Appeasing Pheromone for the treatment of firework fears in dogs. Appl Anim Behav Sci 2007; 105, 311–29
  9. Ogata N, Dodman NH. The use of clonidine in the treatment of fear-based behavior problems in dogs: An open trial. J Vet Behav. 2011;6(2):130-137
  10. Overall KL, Dunham AE, Frank D. Frequency Of Nonspecific Clinical Signs In Dogs with Separation Anxiety, Thunderstorm Phobia, and Noise Phobia, Alone Or In Combination. J Am Vet Med Assoc 2001;219[4]:467-473
  11. Stefanie Riemer, Effectiveness of treatments for firework fears in dogs, Journal of Veterinary Behavior, Volume 37, 2020, Pages 61-70, ISSN 1558-7878,https://doi.org/10.1016/j.jveb.2020.04.005.
  12. Tynes V. Just Ask the Expert: Managing storm phobias with difficult patients-and clients. Vet Med 107[5] May 01, 2012: 206-207

Por Rosangela Gebara

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